A liturgia da Palavra deste Domingo ao fazer memória da ação criadora e redentora de Deus e lhe dedicar um dia, tanto no Antigo Testamento (o sábado para os judeus) quanto no Novo Testamento (o domingo para os cristãos), convida-nos a refletir sobre a importância de um dia dedicado ao Senhor e como devemos santificá-lo em meio a uma sociedade hodierna cada vez mais isenta ou insensível aos apelos do sagrado" reafirmou Dom Somalo na homilia deste 02/06/2024, IX Domingo do Tempo Comum na Santa Missa na Basílica Menor dedicada a Nossa Senhora do Rosário, sede da nunciatura do Brasil, em São Paulo.

Homilia Integral

No Evangelho (Mc.2,23–3,6), Marcos nos apresenta uma polêmica de Jesus com os Fariseus nascida no ato dos apóstolos debulharem espigas de trigo para saciar a fome em dia de sábado e que culmina na cura da mão atrofiada de um homem. O episódio nos mostra a comunidade em um momento de pausa restauradora da missão, e manifesta que um momento de convívio fraterno pode se tornar uma contenda quando se vive mergulhado no rigorismo fundamentalista que sufoca a fé.

O Dia do Senhor que deveria ser um dia de descanso das tensões e angústias cotidianas pode se tornar um fardo por causa do sentimento gerado pelo medo de ofender a Deus pelo simples gesto de tocar em um objeto. Sua liberdade diante dos preceitos da lei é, na verdade, um convite a vivermos não do preceito da letra fria, mas da Lei que assumimos em verdade no nosso coração. E provavelmente uma das melhores maneiras de honrar e santificar o Dia do Senhor é fazer o bem como Jesus demonstrou na cura da mão atrofiada que impedia o homem de trabalhar e viver com dignidade.

Ao curar – em dia de sábado – o homem que tinha a mão atrofiada, Jesus realiza o propósito original do dia do Senhor: preservar a dignidade de alguém. A cura deste homem realizada em dia de sábado representa uma nova criação como símbolo para a nova e definitiva criação que será realizada no novo Dia do Senhor (Domingo/Ressurreição). Por isto, os primeiros cristãos rapidamente entenderam que o Dia do Senhor, era uma pausa restauradora em meio a labuta e agitação semanal para ganhar o pão cotidiano e que precisava ser vivenciado como experiência vivificadora diante de Deus. Diz a Didaqué: “Não ponhais os vossos assuntos temporais acima da palavra de Deus, antes, abandonando tudo no dia do Senhor para ouvir a Palavra de Deus, correi com diligência às vossas igrejas, pois nisso se manifesta o vosso louvor a Deus. Que desculpa terão diante de Deus os que não se reúnem no dia do Senhor para ouvir a palavra de Deus e alimentar-se com o alimento divino que permanece eternamente?” (Cf. Didaqué, ll, 59, 2-3).


Numa sociedade cada vez mais PROFANA, para que se alcance a evangelização do mundo, é particularmente urgente realizar um apostolado eficaz a respeito da santificação do domingo, de modo que a piedade penetre no coração das famílias. No entardecer do século passado o Papa Pio XII nos lembrou que o domingo é ocasião para descansar em Deus, para louvar e adorar, suplicar e agradecer, pedir perdão pelos atos maldizentes da semana que passou e pedir-lhe a graça santificadora para a nova semana. É momento propício também para voltar o coração à família, aos amigos, a todos que o Senhor nos confia. 

Em suma, o dia isento do trabalho deve ser usado não apenas para descansar o corpo, mas também o coração, pois como nos ensina Santo Agostinho, “nós fomos feitos para Deus e nosso coração permanecerá inquieto enquanto não descansar n’Ele”. (Confissões L. 1,1,1).